Animal Crossing: New Horizons - o fenômeno da quarentena
- Pugna!
- 14 de ago. de 2020
- 4 min de leitura
O video game Animal Crossing foi lançado no dia 20 de março desse ano, ou seja, no início da quarentena na maioria dos países. Cinco milhões de cópias digitais foram vendidas em seu primeiro mês, quebrando vários recordes quanto à venda de games. Mas o que tornou o jogo tão atraente para causar isso? Seria culpa da própria quarentena ou da qualidade do jogo? Nesse artigo, Animal Crossing e sua fama serão analisados, além de seu impacto mundial.
Primeiramente, acho válido começarmos com um pouco de contexto acerca do jogo. A franquia Animal Crossing surgiu em abril de 2001, desenvolvida pela Nintendo e criada por Katsuya Eguchi e Hisashi Nogami. Em quase todas as versões do jogo, um avatar humano mora em uma vila habitada por vários animais antropomórficos, ou seja, que falam com o jogador e expressam emoções. É possível realizar várias atividades, como pesca, caça de insetos, escavação de fósseis, plantação e compra e venda de produtos diversos, diariamente, já que o jogo utiliza o relógio do console para realizar uma simulação em tempo real. Dessa forma, há uma mudança de ambiente da manhã para a noite e de estações, ou seja, no hemisfério sul, por exemplo, há nevascas em junho e julho e árvores floridas em setembro e outubro. Outrossim, usuários que só participam da simulação à noite no tempo real não conseguem experienciar o jogo no modo diurno.

A franquia sempre fez sucesso entre gamers ávidos de todo o mundo, mas sua popularidade extrema só era atingida nos Estados Unidos e na Ásia. Depois do primeiro jogo, Animal Crossing: Wild World foi lançado em 2005, quintuplicando as milhões de unidades vendidas por seu predecessor. Surpreendentemente, o sucessor City Folk não foi tão vendido quanto Wild World, totalizando aproximadamente 3.38 milhões de unidades vendidas e tendo a nota 73 no Metacritic, resultado de diversas críticas negativas. Quatro anos após tal fiasco, foi lançado New Leaf, que teve a melhor recepção do público e da crítica até então.
Oito anos depois, surge New Horizons, uma versão totalmente transformada da original, com designs agradáveis e mais interativos, além de elementos contemporâneos, como a adição de um celular individual para cada avatar, onde é possível acessar aplicativos de progresso diário, tirar fotos com animações e entrar em contato com outros jogadores. O lançamento do jogo foi alvo de críticas e teorias da conspiração em toda a internet, devido não somente à renovação da franquia como também à escolha peculiar da data de estreia, que foi, em muitos países, um dos primeiros dias de quarentena oficial. Tais críticos alegavam que a Nintendo estaria se aproveitando de um momento de fragilidade mental e econômica para persuadir mais pessoas a comprarem o jogo, um argumento que acabou sendo invalidado.

Animal Crossing se tornou uma eficiente válvula de escape para os problemas trazidos pela pandemia em geral, as crises políticas e as frequentes preocupações e ansiedades intensificadas pelas redes sociais. Ir a uma ilha deserta e ter a missão de construí-la e decora-la do modo que quiser, ao mesmo tempo em que se pode realizar diversas atividades que mudam a cada dia, é mais do que necessário para se desconectar totalmente do mundo real... Mas seria se desconectar algo totalmente positivo?

Eu acho que sim, mas tudo ao meu redor me mostra que é inútil. Digamos que um aluno de segundo ano do ensino médio, em uma semana de férias, decida desligar seu celular, sua internet e seu computador durante a semana inteira e apenas ler, descansar e jogar Animal Crossing. Nos dois primeiros dias, ele conseguirá realizar as três atividades plenamente, mas logo ficará cansado de ler e sentirá saudade do celular e dos estudos; "E se o coordenador tiver mandado alguma notícia no grupo? E aquela questão bem específica de física que eu não entendi? E se eu não souber justo esse assunto e ele cair no vestibular próximo ano e eu perder minha vaga por uma questão?". Parece drama, certo? Bom, é a realidade que cerca a mim e aos meus colegas. Durante tal semana, o estômago se embrulha enquanto estamos vendo um filme ou lendo, a sensação de culpa e a ansiedade que não deviam existir aumentando lentamente, mas de forma intensa.
Enquanto eu me sentia exatamente assim no começo da quarentena e estava cansada de ler e escrever, eu me virei para Animal Crossing. O jogo me fez querer acordar todo dia para plantar uma flor, pescar ou construir uma ponte virtualmente. O ritmo calmo é contagiante e me trazia paz quando nem a poesia deixava meu coração quentinho. Claro, desenvolver um vício quanto ao jogo não é saudável, porém tê-lo quando se precisa de conforto não é nada ruim.
Ademais, o jogo também tem um valor político imenso: durante grande parte da pandemia, ele foi usado por ativistas democráticos em Hong Kong para realizar protestos virtuais e pacíficos. Em contrapartida, o governo chinês proibiu a venda do jogo em todas as lojas possíveis. Não obstante, Animal Crossing continua servindo como uma ferramenta eficaz para os ativistas de todo o mundo no isolamento social.
Com o passar dos mais de cinco meses de quarentena, o jogo continua ganhando milhões de usuários todo dia e a paixão de tais indivíduos pela singela magia da simulação só aumenta. Em suma, é seguro afirmar que Animal Crossing é um dos únicos prazeres simples e nada estressantes que, com certeza, te farão sorrir e continuar otimista numa época em que quase tudo que vemos no jornal arranca nossa esperança.
-Por Ana Ferreira da Motta Costa
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