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Homofobia: questão de sexualidade divergente ou puro preconceito?

  • Foto do escritor: Pugna!
    Pugna!
  • 29 de out. de 2020
  • 5 min de leitura

A homofobia é o preconceito contra homossexuais, uma característica latente de nossa sociedade, infelizmente. A sexualidade humana é muito complexa, ela não funciona do mesmo modo em todas as situações, todos os locais e todas as épocas, tendo seu modelo “padrão” ou “correto” como dependentes de diversos fatores. Na Grécia clássica, a de Homero e a de Sócrates, a sexualidade estranha era não ter sua iniciação sexual com um mestre filósofo, como foi o caso do imperador Alexandre o Grande. Este foi iniciado por Aristóteles e posteriormente explorou livremente tal área do autoconhecimento, tendo relatos da realização do ato inclusive com eunucos. Nessa mesma época seria, no mínimo, uma atitude gauche utilizar o termo homossexual, que só veio a ser cunhado no século XIX.


A própria palavra teve alterações em estrutura e sentido, na Idade Média, a igreja utilizou e disseminou a palavra “sodomia”, principalmente devida passagem bíblica da destruição de Sodoma e Gomorra, há interpretações que falam sobre isso ser devido a tendência homossexual da população das cidades. A interpretação do medievo persiste, a ideia de que pessoas nascem ou biologicamente homens ou biologicamente mulheres e de que a partir daí tudo é natural (entenda o hermafroditismo como estatisticamente irrelevante). Tal concepção biologizante era o entendimento da época, hoje, é preconceito travestido de estudo ou “curso natural das coisas”, ora, o que seria natural se a própria natureza desconhece esse conceito.


Eu poderia me alongar citando comportamentos homossexuais em animais irracionais, como: leões, girafas, ou pinguins. A questão, contudo, é, em nenhum desses animais, ditos irracionais, que apresentam esse comportamento —o qual não é fruto de uma sociedade permissiva, muito menos de sodomia, como pregavam os intelectuais do medievo e alguns pseudo-intelectuais de hoje— há as mesmas estatísticas de óbitos que as nossas, e não ajuda o fato de alguns animais estarem em extinção, e nós somente presos em estado de natureza, pois é isso que se percebe quando se nota a ausência do Estado para essa comunidade.


A despeito dessa ideia de “curso natural das coisas” há o “eu”. A forma como nos vemos, como sentimos que deveria ser, quem nos atrai. Isso não é uma fuga da tão bem conceituada, quase cultuada normalidade, não é uma doença, é uma expressão de si, algo que a ciência não explica, pois da mesma forma que nenhum número quantifica o gostar, nenhum hormônio explica o amor. Amar não é uma doença, independentemente de qual seja o órgão sexual de seu parceiro!

“Amo-te como um bicho, simplesmente De um amor sem mistério e sem virtude Com um desejo maciço e permanente. E de te amar assim, muito e amiúde É que um dia em teu corpo de repente Hei de morrer de amar mais do que pude.”

Trecho do poema: “Soneto do amor total”, 

de Vinícius de Moraes

Além de a tentativa de correção da sexualidade ser idiota simplesmente por significado, pois corrigir pressupõe um erro, é estupido pensar em sexualidade como questão de escolha. Na esdrúxula hipótese da escolha, a sociedade nos daria duas opções, na primeira delas: somos privilegiados com a aceitação, da família, da nossa religião, de poder andar na rua sem nos olharem torto. Já na segunda: sofremos o repúdio, a família nos expulsa de casa, a nossa religião nos condena e apanhamos na rua. Qual você escolheria, leitor? E por que não foi a segunda? 


Achar que seres sociais tais quais os seres humanos escolheriam ser párias da sociedade é tão inteligente quanto achar que se escolhe ser gay.


Agora uma reflexão. Não seria possível que a simples pergunta “de onde vem?”, já não contém um certo preconceito? Pois não se faz a mesma pergunta a um heterossexual, ao menos eu nunca vi. Um colega discutindo com outro sobre heterossexualidade e surgem as dúvidas: de onde vem isso? Será que é culpa do pai? Não criaram ele ou ela direito!


O preconceito surge da não aceitação do outro, a não aceitação do outro, por sua vez, surge de uma tentativa, quase que taxonômica, de classificação. Esta pode até funcionar para características objetivas, como a cor de um objeto ou sua forma, mas quando tentamos agrupar criaturas tão complexas quanto seres humanos em caixinhas, baseando-se em espectros da vida tão amplos, como a sexualidade, daí surge o preconceito. Todos merecem ser amados, se não, no mínimo respeitados.

Havia a argumentação, por parte de algumas igrejas, de que a criminalização da homofobia afetaria a atividade religiosa. O que é, ao menos na minha opinião, deseuma clara manifestação de culpa, pois se tais religiões (não todas obviamente e nem todos os celebrantes delas) se preocupam com a criminalização do preconceito, não seria isso admitir que elas o praticam? Bom, a repressão penal à prática da homofobia não alcança nem restringe ou limita o exercício da liberdade religiosa, qualquer que seja a denominação confessional professada, pois aos celebrantes é assegurado o direito de pregar e de divulgar, livremente, pela palavra, pela imagem ou por qualquer outro meio, o seu pensamento e de externar suas convicções de acordocom seus códigos sagrados. Toda manifestação religiosa é permitida desde que não configurem discurso de ódio, assim entendidas aquelas exteriorizações que incitem a discriminação, a hostilidade ou a violência contra pessoas em razão de sua orientação sexual ou de sua identidade de gênero.


Para finalizar, o aspecto jurídico do tema, há também a tese de que o crime de homofobia é um racismo social. segundo o ex-ministro do STF, Celso de Mello, o conceito de racismo, projeta-se para além de aspectos estritamente biológicos ou fenotípicos, pois resulta, enquanto manifestação de poder, de uma construção de índole histórico-cultural motivada pelo objetivo de justificar a desigualdade e destinada ao controle ideológico, à dominação política, à subjugação social e à negação da alteridade, da dignidade e da humanidade daqueles que, por integrarem grupo vulnerável e por não pertencerem ao estamento que detém posição de hegemonia em uma dada estrutura social, são considerados estranhos e diferentes, degradados à condição de marginais do ordenamento jurídico, expostos, em consequência de odiosa inferiorização, a uma injusta e lesiva situação de exclusão do sistema geral de proteção do direito.


Tal conceito se liga com a ideia de estigma, do ErwingGoffman, a alguém ou a um grupo se impõe uma marca a ferro e fogo e daí se pratica toda a forma perversa de agressão. Uma estigmatização é mais que um mero olhar de reprimenda, é a característica que desvaloriza, dificulta a aceitação, torna o indivíduo um inapto à convivência social plena. 


Em geral, minha tentativa com meus textos é transmitir conhecimento ou algum valor, mas sei que isso, tão frequentemente quanto escrevo, não acontece. A você, que pulou o texto e veio logo para a conclusão, só para ter a sensação de ter lido algo produtivo (por você eu fico triste também por que falhei em te prender a atenção) e ao preconceituoso convicto que transveste seu ódio em mandamento religioso, eu, o ingênuo redator, que acredita que o mundo ainda pode mudar, só tenho mais uma última reflexão, por que a sexualidade do outro mexe tanto com você? 


“Todos esses que aí estão Atravancando meu caminho, Eles passarão... Eu passarinho!”

Poeminho do Contra, do Mário Quintana


Por: Gabriel Tôrres, o redator ingênuo

Referências Bibliográficas

• Tese do redator ministro Celso de Mello no caso da criminalização da homofobia

• Preconceitos, Homofobia - Leandro Karnal

• Homossexualidade – Pirula 

• Tirinha Armandinho – Alexandre Beck

• Tirinha Jesus – Latuff 

• Cena do filme “Tá dando onda”

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