Olavo Bilac: o príncipe dos poetas
- Pugna!
- 31 de jul. de 2020
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"E eu vos direi: 'Amai para entendê-las!/ Pois só quem ama pode ter ouvido/ Capaz de ouvir e de entender estrelas'." O parnasianismo é conhecido por ser uma escola literária perfeccionista, superficial e objetiva. Bom, essa concepção seria 100% verídica se não fosse por Olavo Bilac que, em seus poemas, demonstrava, além de algumas características parnasianas, uma forte sensibilidade, perfeitamente equilibrada com a razão. Nesse artigo, a história de Bilac e seu incrível trabalho serão analisados.
Olavo Brás Martins de Guimarães Bilac nasceu no dia 16 de dezembro de 1865, no Rio de Janeiro. Durante uma grande parte de sua infância, ele foi criado por sua mãe, Delfina Belmira Guimarães de Paula, pois seu pai foi cirurgião do exército durante a Guerra do Paraguai. Sua criação foi rodeada pelo nacionalismo, por livros e pelo estudo, como a maioria dos jovens da época. Entretanto, divergindo da maioria, ele não teve um caminho tão direto para sua realização e satisfação profissional.
Por ser um aluno extremamente aplicado, Olavo começou a frequentar a Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro aos 15 anos somente para satisfazer as vontades de seu pai, pois na verdade ele almejava a carreira jurídica. Nesse tempo, ele passou a fazer parte da Gazeta Acadêmica e iniciou sua carreira jornalística. Após desistir do curso de medicina no quarto ano, ele passou a cursar direito, mas logo desistiu dessa carreira também; o jornalismo e a literatura o chamavam.
Desde então, Olavo levou uma vida boêmia e continuou a trabalhar como jornalista, por vezes publicando seus poemas nos jornais em que trabalhava. Em 1883, ele teria possivelmente pedido a mão de Amélia de Oliveira, irmã do também poeta parnasiano Alberto de Oliveira, em casamento. Entretanto, a família Oliveira não permitiu que os dois se unissem em razão do estilo de vida de Olavo, que não era considerado adequado para um homem casado. Passou então a escrever frequentemente para os jornais Diário de Notícias e Gazeta de Notícias, nesse último trabalhando juntamente a Machado de Assis. Ele também mantinha uma carreira e influência política, defendendo causas como o serviço militar obrigatório.
Em 1888, ele publicou "Poesias", que incluía diversos poemas com características claramente parnasianas; a obsessão pela forma e perfeição métrica, o racionalismo, a objetividade e a valorização da mitologia e de conceitos da antiguidade clássica. Tais particularidades podem ser notadas claramente no poema "Língua Portuguesa":
"Última flor do Lácio, inculta e bela,
És, a um tempo, esplendor e sepultura:
Ouro nativo, que na ganga impura
A bruta mina entre os cascalhos vela...
Amo-te assim, desconhecida e obscura,
Tuba de alto clangor, lira singela,
Que tens o trom e o silvo da procela
E o arrolo da saudade e da ternura!
Amo o teu viço agreste e o teu aroma
De virgens selvas e de oceano largo!
Amo-te, ó rude e doloroso idioma,
Em que da voz materna ouvi: "meu filho!"
E em que Camões chorou, no exílio amargo,
O gênio sem ventura e o amor sem brilho!"
Nesse texto, Olavo expressa a beleza e o amor que tem pela língua portuguesa e faz uma singela homenagem ao poeta português Luís de Camões, que também já discorreu sobre a língua em seus poemas. No entanto, é notório que Olavo, no poema, não é absolutamente fiel aos preceitos parnasianos, sendo subjetivo e conseguindo equilibrar a razão e a emoção. "Tá bom, autora, ele pode até ter feito poemas assim, que eram importantes na época e tal, mas pra quê eu deveria gastar meu tempo dando atenção à mais um poeta de vocabulário tão formal e às vezes quase incompreensível?" Calma, caro leitor, estamos apenas começando. Eu, como você, também não sou fã desse vocabulário tão refinado e seleto, eu admiro outra coisa: a esperança, e os poemas de Olavo transmitem isso a mim nos momentos mais desmotivadores, seja numa aula às nove da manhã, seja no meio de um simulado com noventa questões.
Alguns me definem como poeta, e eu nunca me julguei digna desse título. Sim, eu escrevo sobre minhas emoções mais incompreensíveis, coloco meu coração no papel, tento pintar uma paisagem à cada linha, mas nunca me preocupei com métrica, rima, ou quantidade de sílabas. Parece que Olavo Bilac não vê o trabalho de poeta como eu via antes de conhecê-lo, ele o vê nu e cru: doloroso, agonizante, mas perfeito desde que expresse a verdade. Em seu poema "A um poeta", essa ideia é transmitida com convicção:
"Longe do estéril turbilhão da rua,
Beneditino escreve! No aconchego
Do claustro, na paciência e no sossego,
Trabalha e teima, e lima , e sofre, e sua!
Mas que na forma se disfarce o emprego
Do esforço: e trama viva se construa
De tal modo, que a imagem fique nua
Rica mas sóbria, como um templo grego
Não se mostre na fábrica o suplicio
Do mestre. E natural, o efeito agrade
Sem lembrar os andaimes do edifício:
Porque a Beleza, gêmea da Verdade
Arte pura, inimiga do artifício,
É a força e a graça na simplicidade."
Ao ler esse poema pela primeira vez, lembrei das noites em que não conseguia dormir por ter um verso em minha cabeça e das diversas vezes em que via coisas simples, como um cadarço desamarrado ou um mosquito no teto, e sentia vontade de mostrar ao mundo (ou ao meu caderno) a sensação estranha que sentia. Com sua metalinguagem, Olavo me mostrou a importância de ser sincera em meus poemas e de nunca tentar fazer algo puramente para agradar os olhos de terceiros; afinal, a Verdade é gêmea da Beleza.
Com o passar do tempo, Olavo ganhou influência no mundo literário. Em 1897, com Machado de Assis, Joaquim Nabuco, Ruy Barbosa e outros, fundou a Academia Brasileira de Letras, órgão que tem como objetivo cultivar a literatura brasileira e a língua portuguesa. Seis anos depois, foi eleito o "príncipe dos poetas" pela revista Fon-Fon. Além disso, por ter opiniões políticas fortes, ele também se envolveu com tal campo. Com a posse de Floriano Peixoto, Olavo participou da fundação d'O Combate, organização que ia de encontro aos interesses de Floriano, em particular a declaração de estado de sítio.
Ele morreu no dia 28 de dezembro de 1918, também no Rio de Janeiro. O primeiro poema que vem à mente de estudantes e fãs de literatura quando Olavo é citado é o famoso "Via Láctea", pois nada como um poema que nos faz gostar de nossas partes estranhas, que nos faz ter esperança e deixa nossos olhos cheios de lágrimas (ou pelo menos emocionados, já que acredito que nenhum amante de poesia é de ferro). "Via Láctea" pode até ser uma crítica aos outros parnasianos da época, entretanto acho que quando o lemos não é o conhecimento literário que prevalece, mas sim o aconchego recebido pelo nosso coração. Finalizo com o poema: "Ora (direis) ouvir estrelas! Certo Perdeste o senso!” E eu vos direi, no entanto, Que, para ouvi-las, muitas vezes desperto E abro as janelas, pálido de espanto... E conversamos toda a noite, enquanto A via láctea, como um pálio aberto, Cintila. E, ao vir do sol, saudoso e em pranto, Inda as procuro pelo céu deserto. Direis agora: “Tresloucado amigo! Que conversas com elas? Que sentido Tem o que dizem, quando estão contigo?” E eu vos direi: “Amai para entendê-las! Pois só quem ama pode ter ouvido Capaz de ouvir e de entender estrelas.” Por Ana Ferreira da Motta Costa
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